RESENHA: Planetes

Planetes é a série de mangá futurista de Makoto Yukimura que narra o cotidiano dos “lixeiros espaciais” “Hachimaki”, Yuri e Fee a bordo da antiga nave DS-12.

O ano é 2074. A humanidade desenvolveu-se tecnologicamente a ponto de conseguir sustentar uma gigantesca base internacional lunar habitada por diversos profissionais com funções específicas para auxiliar nos trabalhos de exploração espacial.

A exploração consiste principalmente na tarefa de extrair minérios e outros recursos que podem ser reaproveitados na Terra que, devido os séculos de degradação ambiental, está seriamente desfalcada de riquezas naturais.

O interessante do primeiro volume é que Yukimura consegue apresentar esse contexto gradualmente, sem se utilizar de uma abordagem direta, a partir dos problemas enfrentados por personagens, em grau de importância na escala social, secundários, embora centrais no enredo traçado, conseguindo fisgar o interesse do leitor.

Ao longo dos capítulos, esse pano de fundo aparentemente camuflado pelo foco no cotidiano, dramas, ambições e hábitos dos tripulantes da DS-12 acaba ganhando mais cores, mais corpo, apesar de jamais se debruçar inteiramente sobre essa camada, sempre flertando em pinceladas ora mais vigorosas, ora mais discretas, revelando um quadro político/social complexo que alimenta a esperança de que nos próximos volumes o leitor irá se deparar com algo grandioso, emocionante, que deixará sua marca na memória, se tornará uma referência toda vez que outros trabalhos abordarem algo parecido.

O autor é muito competente e imaginativo ao desenvolver tramas com situações particulares somente possíveis graças ao universo singular que desenvolveu e demonstra conhecer, ou ter pesquisado bem, conceitos, peculiaridades, situações próprias do ambiente espacial utilizando-as como elementos importantes na estória.

A arte é excelente. Muito bem detalhada, tanto os personagens como os ambientes físicos, e você não se perde nos momentos de ação.

Não sei se o crédito maior deve ir ao criador ou o tradutor, que no caso é tradutora, Lídia Ivassa, mas percebe-se o domínio da linguagem coloquial deixando os diálogos mais arejados e fluídos.




O time cômico do autor é muito bom e os personagens secundários que surgem no decorrer dos volumes agregam bastante nesse sentido, embora não é certo resumi-los apenas como instrumentos de humor e a narrativa cuida em equilibrar a dosagem para não descaracterizar o propósito inicialmente estabelecido.

Até agora tudo foi flores, mas, infelizmente, a série tem os seus espinhos.

Primeiro começo com o grave erro de impressão da Panini no volume 1, e espero que tenha sido corrigido nas reimpressões posteriores. A edição que tenho veio com páginas impressas de cabeça para baixo e fora da ordem sequencial correta, prejudicando a imersão imediata na obra além de gerar pequena confusão para montar o quebra cabeça que se tornou a edição maluca e encaixar as peças mal distribuídas do roteiro.

Lembra o que falei sobre a expectativa gerada quanto o desenvolvimento do macrouniverso nos números seguintes? Bem, o volume 2 quebra um pouco essa expectativa, mas revela-se uma frustração saudável.

O universo continua a se expandir adicionando mais itens interessantes e preservando as virtudes mencionadas no primeiro, se fosse uma live action, diria que a segunda temporada foi uma boa continuação da primeira, no entanto nota-se que todo o potencial do panorama rico arquitetado ainda não foi usufruído ao máximo. Mas até esse momento, o leitor pondera que o autor está esticando a série a fim de assegurar uma saudável longevidade e guardar o melhor pro final, o que serve de alento uma vez que o mangá está proporcionando boas horas de leitura e naturalmente se torce para que tudo que é bom não acabe tão cedo.

Nisto vem o terceiro volume. Nova frustração. Mas novamente uma frustração tolerável. Yukimura acaba centrando-se completamente em questões existenciais envolvendo o protagonista em definitivo Hachirota “Hachimaki” Hoshino. Percebe-se a adição de pautas interessantes envolvendo temas universais adaptados ao futurismo cativante elaborado engrandecendo a obra em termos de sofisticação, de filosofia; sente-se que tem em mãos uma obra original que se distingue de tantas outras por se revelar e, não ter medo de sê-la, adulta, madura, evitando o desfile de onomatopeias descerebradas. Contudo, o pano de fundo em tese fervilhante é abordado muito discretamente deixando toda a expectativa para o quarto e último volume da série.

E dessa vez não se tem escapatória. É uma grande decepção.

O idealizador continua trilhando o caminho existencial e fica nítido que há pouca coisa de interessante a se acrescentar nesse campo, tornando os capítulos arrastados, centrando-se em aprofundamento de personagens quando se espera um bom clímax, tratando o contexto político como algo menor, escancarando que jamais teve intenção de explorá-lo vigorosamente. É uma ficção científica concentrada no drama e questionamentos de tipos (ou um drama que utiliza os elementos cativantes de uma ficção científica?).

O desfecho da saga fica muito aquém do esperado. É morno, com resoluções dúbias, e, por isso, frustrante.

Colocando na balança: a jornada foi boa, mas podia ser melhor.

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